Está na ordem do dia.
Você não precisa concordar. Você precisa ler!!
MM
Pois é, ano de Copa do Mundo, eleições, mas também de muitas catástrofes naturais pelo mundo todo. E o que é pior: elas estão cada vez mais democráticas, matando também os ricos e bem nascidos, né? Mas olha, além desses três assuntos, tem a discussão sobre os Direitos Humanos. Tem gente sendo assassinada a rodo por esse Brasilzão a fora, né? Se tem uma coisa que não podemos deixar para depois é a luta pelos humanos direitos. Esse novo texto trata disso, porém, como nos dois primeiros - "Por que não votar em José Serra?" e "Dilma ou Marina? Eis a questão!" - não podemos deixar de falar em política, porque o desrespeito aos mesmos é consequência da política errada que temos em nosso País. Se gostar, envie-o para os seus contatos.
“O sol nasceu para todos, mas o capitalismo, através de pesquisas sobre os raios solares, já vai dar um jeito nisso.”
(Millôr Fernandes, escritor e humorista)
Ao escrever, dialogo com a minha amiga consciência, dizendo para ela que isso me mantém em paz com ela. Estou fazendo a minha parte. Estou fazendo algo, escrevendo já há oito anos. E como disse o Érico Veríssimo em seu Solo de Clarineta:
“(...) o menos que um escritor pode fazer, numa época de atrocidades como a nossa, é acender a sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétrica, acendamos o nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como sinal de que não desertamos nosso posto.”
Eu escrevo. E sofro muito quando escrevo. Mas, usando as palavras do Chico, “quando chegar o momento, esse meu sofrimento vou cobrar com juros, juro!” Faz escuro, mas eu escrevo. Sou um cidadão que tem uma exigência, um gosto, uma ambição intelectual. E detesto a estupidez e a indiferença daqueles que não querem pensar. Eu nasci no início da década de 70, em plena ditadura militar, deve ser por isso que o assunto democracia me instiga tanto. Talvez porque a democracia brasileira ainda esteja em consolidação, ainda seja uma democracia muito precária. Mas, no entanto, sei que nunca houve tantos anos seguidos de experiência democrática no nosso País, como nesses últimos vinte e poucos anos.
Sou um cidadão comum. Não faço parte de nenhum grupo, não sou filiado a nenhum partido político (não por falta de pedidos, mas por consciência mesmo). Aplico o princípio de Groucho Marx: “Não acredito em instituições que aceitem pessoas como eu”. Isso não quer dizer que não possa me juntar a outras pessoas ou organizações para fazer reivindicações, como já fiz inúmeras vezes, e farei, quando for preciso. Agora considero que, para o indivíduo ser prestável republicanamente, tem de ter um nível de compreensão e de conhecimento do que acontece no campo político, que é fundamental. É fundamental que o indivíduo acompanhe, esteja ligado, sabendo dos fatos e conhecendo os caminhos para reagir. Se não faz isso, é alienado, é imprestável e não deve reclamar do que está acontecendo de errado na sociedade! Inclusive da violência, pois “quem planta preconceito, racismo e indiferença, não pode reclamar da violência” (Natiruts).
Sobre isso, veja o que escreveu o Luciano Pires, no seu livro Brasileiros Pocotó: Reflexões sobre a mediocridade que assola o Brasil, p. 21-2: “O neanderthal político chama o velho político de sapo barbudo. E na outra eleição estão os dois abraçados, jurando amor eterno. Não importa quantas crises o Brasil tenha vivido. Todo ano paramos por causa da nova crise que, essa sim, vai acabar com o País. E dá-lhe juros altos, papo-furado na mídia, estatísticas imbecis e o povo, mais uma vez, olhando para o chão e achando que não tem jeito”. Nesse sentido, concordo também com o que disse o Stedile na Caros Amigos de janeiro, página 19: “Somos a nona sociedade do mundo em volume de riqueza produzida. Mas estamos em 75º lugar no nível das condições de vida da população, e somos a sétima pior sociedade do planeta em desigualdade social. As soluções para esses problemas não são econômicas ou administrativas. O Brasil não precisa de bons gerentes. Precisa de povo organizado, consciente, que se mobilize para resolver seus problemas. E de lideranças políticas comprometidas com as mudanças.”
O cientista político Emir Sader, em texto na mesma revista questiona: “Há quem diga que nada de importante se decide em 2010. Seria o mesmo que tivesse Alckmin ou Lula em 2006? Será o mesmo a volta da equipe tucano-demoníaca ou o aprofundamento do governo atual com Dilma?” É a sociedade do escapismo. Vivemos numa fuga constante. É como num desenho antigo, do leão da montanha medroso. Sempre que aparecia um perigo, ele fugia dizendo a frase “saída estratégica pela direita/esquerda!” Ainda bem que tenho o Nietzsche para me consolar. No seu maravilhoso Assim Falava Zaratustra, tem uma passagem interessante: “A praça pública está cheia de palhaços solenes e o povo se vangloria de seus grandes homens. São para eles os senhores do momento. O momento os oprime e eles a ti, por sua vez, oprimem. Exigem de ti um sim ou um não. Infeliz! Queres colocar-te entre um pró e um contra? Não invejes esses intransigentes, esses exigentes, tu que amas a verdade! Nunca a verdade pendeu do braço de um intransigente.”
Só sei de uma coisa: o mais importante é botar a boca no mundo, é participar, aproveitar as janelas que se abrem para discutir e conversar com os outros. Essa discussão que está acontecendo, por exemplo, sobre os direitos humanos. Ninguém pode ficar de fora! É uma coisa que diz respeito a todos os cidadãos desse País! Vivemos num País onde as pessoas são mortas dentro de hospitais, em suas próprias casas, nos acampamentos do MST nos quatro cantos e, principalmente nos presídios. Há pessoas que estão na luta pelos direitos humanos das minorias que estão em listas negras, correndo perigo de serem mortas pelas armas de pistoleiros ou jagunços... A mando de quem? Adivinha. Esse é o Brasil! Por aqui ainda temos trabalho escravo, principalmente no Norte/Nordeste (inclusive com o apoio e a conivência de alguns deputados em Brasília!). Por aqui ainda temos, nas grandes favelas e periferias, milícias formadas por “policiais” para caçar e matar nossos jovens (a maior parte deles negros, é só dar uma olhada nos jornais de Salvador). Sem falar do tráfico internacional de brasileiras - para fins sexuais, na maioria dos casos. Enquanto isso, os gastos públicos estão na fronteira da estratosfera (a roubalheira idem) e os governantes, sorrindo cinicamente como se nada estivesse acontecendo. Possivelmente, confiando na “burrice coletiva” de um povo apático e/ou desmemoriado.
E ainda dizem que vivemos num Estado Democrático de Direito... Um dia, chegaremos lá. Como disse o Moisés Naím, Doutor em Economia pelo MIT e colaborador do jornal espanhol El País: “em política, a cegueira não é produto de enfermidades, mas de interesses.” Como essa frase se encaixa tão bem ao nosso País! Isso é a cara do Brasil!
Democracia, direitos humanos e paz. São esses os ideais de um dos grandes pensadores do século XX, o filósofo italiano Norberto Bobbio. Explicando esses ideais, um dos seus melhores alunos, o professor de Filosofia Política na Universidade de Turim Michelangelo Bovero diz que “o desejo da paz se opõe ao reino da violência, o princípio universalista dos direitos humanos se opõe ao mundo particularista das paixões e dos interesses, a ideia da democracia como transparência, como ‘governo público em público’, se opõe à cortina ‘ideológica’ dos enganos e à opacidade do poder”. Mas, segundo ele, Bobbio “também enfatizou a interdependência dos três ideais entre si, no sentido que a busca coerente de cada um deles obriga à busca também dos outros, e que a própria definição de cada um deles requer o uso das noções correspondentes aos outros dois: ‘Direitos humanos, democracia e paz são três momentos necessários ao mesmo movimento histórico: sem direitos humanos reconhecidos e protegidos não há democracia; sem democracia não há condições mínimas para a solução pacífica dos conflitos. Em outras palavras, a democracia é a sociedade dos cidadãos, e os súditos se tornam cidadãos quando deles passam a ser reconhecidos alguns direitos fundamentais; haverá paz estável, uma paz que não tem a guerra como alternativa, somente quando não mais houver apenas cidadãos deste ou daquele Estado, mas do mundo’”.
O principal direito é o direito à humanidade. Acontece que para fazer valer os direitos humanos precisamos abraçar de coração ideias como respeito à diversidade de gênero, de raça, de cor, de credo, de classe, de nacionalidade. Sem isso, ficamos só no discurso. Com tanta coisa podre acontecendo neste imenso País tropical, com tanto desrespeito aos direitos humanos de tanta gente, cabe aqui citar uma tirinha do Charlie Brown, onde o mesmo caminha solitário em direção oposta a uma multidão de manifestantes, cada qual portando um cartaz com ‘abaixo isto’ e ‘abaixo aquilo’. Então a Lucy pergunta ao Charlie Brown se ele não iria carregar uma faixa com ‘abaixo a civilização’. Brown responde, filosófico: “Não precisa... ela cairá, de tão podre.”
E para encerrar esse terceiro texto do ano, permita-me citar o poema de Franco Fortini:
“Na amurada da ponte
A cabeça dos enforcados
Na água da fonte
A baba dos enforcados
No calçamento do mercado
As unhas dos fuzilados
Sobre a grama seca do prado
Os dentes dos fuzilados
Morder o ar morder as pedras
Nossa carne não é mais de homens
Morder o ar morder as pedras
Nosso coração não é mais de homens
Mas lemos nos olhos dos mortos
E sobre a terra liberdade havemos de fazer
Mas estreitaram-na nos punhos os mortos
A justiça que se há de fazer.”
Aguarde o próximo texto. Enquanto isso, vamos rezar aquela oração de São Jorge: “Que meus inimigos tenham pés, e não me alcancem, que meus inimigos tenham mãos, e não me toquem...”
(Márcio Melo, professor de História, Filosofia e Sociologia; estudante de Direito; cidadão aprendiz de historiador, de filósofo e de humanista) Contato: marciomelo_opensador@hotmail.com
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