sábado, 8 de novembro de 2008

Quebra de sigilo esquenta guerra na PF

Autor(es): Germano Oliveira, Soraya Aggege e Adauri Antunes Barbosa
O Globo - 08/11/2008


CRISE NA PF Suspeita de ação da polícia sobre jornalistas e delegados irrita procuradores e juízes A suspeita de que a Polícia Federal quebrou ilegalmente o sigilo de jornalistas que acompanharam a Operação Satiagraha, em julho, aumentou o clima de guerra na instituição. Para membros do Ministério Público Federal, a PF agiu irregularmente ao pedir à Nextel números dos telefones dos envolvidos. A PF nega ter agido ilegalmente e afirma que apenas pediu uma relação das torres da Nextel próximas ao local de buscas. A Justiça não autorizou a quebra de sigilo.
A suspeita de que a Polícia Federal quebrou ilegalmente o sigilo telefônico de jornalistas que acompanharam a Operação Satiagraha, em julho, aumentou o clima de guerra dentro da instituição. Há informações ainda de que a PF estaria sonegando informações ao Ministério Público Federal (MPF), irritando procuradores e até juízes federais. A PF negou que tenha quebrado o sigilo de telefones, mas confirmou que pediu uma relação das torres da empresa de telefonia Nextel perto dos locais onde estavam sendo feitas as prisões da Operação Satiagraha, que investiga supostos crimes cometidos pelo banqueiro Daniel Dantas. Integrantes do MPF em São Paulo estão convencidos de que, a pedido da PF, a Nextel liberou os números dos telefones sem autorização judicial. - Se a PF desconfiava do delegado Protógenes Queiroz (responsável pela Satiagraha), deveria ter pedido a quebra do seu sigilo e de busca e apreensão em documentos que porventura estivessem em seu poder. Mas jamais poderia ter pedido quebra de inúmeros telefones e anexado números de jornalistas que estavam nos locais das prisões em julho. Também não poderia pedir a apreensão de documentos e até computadores da Abin - disse ontem uma autoridade do Ministério Público. Juízes não autorizaram pedido Operação G é como delegados se referem ao inquérito da PF para apurar o suposto vazamento de informações da Satiagraha, quando jornalistas da TV Globo acompanharam as primeiras prisões e apreensões, incluindo as de Dantas, do empresário Nagi Nahas e do ex-prefeito Celso Pitta. A PF nega que tenha quebrado sigilos telefônicos ilegalmente, mas não explica por que encaminhou à Justiça pedido para a escuta de telefones de delegados e policiais que estavam nos locais da operação e também de repórteres, anexando ao inquérito números de quase 20 aparelhos Nextel. O pedido foi levado primeiro ao juiz da Satiagraha, Fausto De Sanctis, que teria se recusado a atendê-lo, segundo O GLOBO apurou. A quebra do sigilo dos telefones Nextel de repórteres da TV Globo e também de vários policiais foi pedida, então, ao juiz da 7ª Vara Federal de São Paulo, Ali Mazloum, que não autorizou a escuta. Ao ser consultado sobre o pedido da PF, formulado junto com a inicial do inquérito policial e enviado à Justiça, o procurador do MPF Roberto Dassiê, coordenador do Grupo de Controle Externo da Atividade Policial, teria se indignado. Ele foi contra também o pedido da polícia para executar mandados de busca e apreensão na casa de delegados e na sede e em escritórios da Abin. O procurador está de férias, mas o MPF já tem a informação de que ele está estarrecido com o que a PF fez para apurar o vazamento da Satiagraha. - O vazamento da operação, com jornalistas tendo acesso às prisões e também às escutas das conversas dos réus pegos na operação, é um crime realmente. Se o delegado Protógenes comunicou aos jornalistas como seria a operação, quem seria preso - já que a TV mostrou os réus sendo presos -, ele cometeu um crime. Mas, para apurar esse vazamento, a PF cometeu outros crimes e ilegalidades, já que não poderia ter quebrado o sigilo telefônico de repórteres sem autorização judicial - disse a fonte do MPF. No pedido de investigação sobre o vazamento, a PF cita a TV Globo e jornalistas do jornal "Folha de S. Paulo", que teriam tido acesso à Satiagraha antes dela começar. - O MPF não concordou com busca e apreensão na Abin e também na casa de delegados. Isso foi considerado inadmissível. Afinal, a PF estava se recusando a dar detalhes do que pesava contra os investigados e negou-se até a fornecer detalhes dos custos da Satiagraha. Eles disseram à Justiça que gastaram R$400 mil na operação, mas não detalharam como o dinheiro foi gasto. Se estavam omitindo provas para o MPF, não poderíamos autorizar buscas e apreensões sem saber as verdadeiras intenções da PF - disse um procurador. A PF alegou ao juiz Mazloum que não poderia dar os detalhes pedidos pelo procurador Roberto Dassiê porque fazia parte do sigilo da investigação. Segundo a fonte, o juiz Mazloum autorizou buscas e apreensões, mas não aceitou a quebra do sigilo dos telefones Nextel relacionados pela PF. - A PF enviou à Justiça números dos telefones (IDs) Nextel de todas as pessoas que estavam nas imediações dos quatro locais de prisões dos banqueiros ligados a Dantas, Nahas, Pitta e sede da PF. Se mandou os números, é porque já tinha quebrado o sigilo - diz o procurador. Em nota, a empresa nega que tenha feito isso: "A Nextel Telecomunicações Ltda. informa que segue todos os procedimentos jurídicos e legais para interceptações de chamadas". A PF teria a lista das ligações feitas e recebidas pelas 20 pessoas que estavam no local das operações, mas o teor das escutas não está anexado aos autos. Como houve irregularidades na quebra dos sigilos, o MPF acha que a Operação G pode ser considerada extinta juridicamente. - Tudo o que foi feito pode ser nulo e quem cometeu ilegalidade pode ser responsabilizado. Essa operação põe em risco a liberdade de imprensa, que é um direito constitucional.

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