quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Depois da CPMF



À alvissareira extinção da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), impropriamente apelidada de “imposto do cheque” porque, na verdade, incide sobre quase todos os débitos em contas-correntes ou de poupança, seguem-se as discussões a respeito dos cortes de despesas nos três níveis de governo e nos três poderes, e especulações acerca da criação de um novo tributo em seu lugar.

O “Impostômetro” (
http://www.deolhonoimposto.com.br/), um painel instalado na cidade de São Paulo pela Associação Comercial de São Paulo, acusava, em 18 de dezembro, mais de R$868 bilhões arrecadados no ano pela União, estados e municípios. A entidade irá acrescentar um dígito no painel, pois a colheita nacional de tributos, mesmo sem a CPMF, atingirá a casa do trilhão já em 2008.

Mesmo com essa dinheirama toda capturada pelo poder público, há quem defenda a recriação de um imposto exclusivo para a Saúde (e nessa lógica, por que não outro para a educação, mais um destinado à segurança, etc.?). Se governar é estabelecer prioridades, talvez seja pela descrença na capacidade de nossos governantes de fazê-lo que ainda haja gente discursando em favor de uma possível versão definitiva da extinta contribuição provisória - que durou dez anos -, exclusiva para a Saúde.

O poder fiscalizador da CPMF que não é tão grande quanto se diz. Embora os órgãos de governo se valham das informações obtidas através dela, é preciso observar que só são revelados os valores que saem das contas-correntes ou de poupança, já que aplicações diretas em cadernetas de poupança, em ações ou na chamada conta-investimento nada pagam até que sejam resgatadas, e o dinheiro efetivamente gasto. Assim, digamos que um corrupto ou mero sonegador deposite algum dinheiro diretamente nestas contas e deixe-o lá, rendendo, até aparecer uma oportunidade de lavá-lo: quem ficará sabendo?

Há outras maneiras de sonegar a CPMF, como o endosso em branco de cheques, prática que possibilita a criação de verdadeiras câmaras de compensação particulares, onde empresas trocam cheques entre elas. Através do mercado acionário é fácil repassar valores a terceiros, por meio de dois expedientes bem simples: pode-se fazer uma transferência de ações entre duas ou mais pessoas, ou uma operação em bolsa onde o lucro decorrente da oscilação na cotação de uma ação ou opção qualquer fica com a parte que se quer beneficiar.

O ideal, para efeito de fiscalização e combate à sonegação e corrupção, é saber quanto entra nas contas-correntes, de poupança e de investimento. É o que basta, e não é necessário fazer isto através de um imposto, pois da mesma forma que a Receita Federal do Brasil (RFB) recebe das administradoras informações sobre a movimentação dos cartões de crédito, os bancos e corretoras de valores podem e devem ser obrigados a dizer quanto entrou nas contas-correntes, de poupança e de investimentos, mensal ou mesmo semanalmente, pois o trabalho não é maior do que o de repassar os dados da CPMF. Para evitar distorções nas informações sobre as entradas nas contas, é imprescindível que bancos e financeiras informem também os valores de empréstimos creditados.

Praticamente toda semana os órgãos policiais desmantelam esquemas de corrupção que funcionavam há anos, a despeito da vigência da CPMF. E foi através das informações prestadas pelas administradoras de cartões de crédito que a Secretaria da Fazenda de São Paulo autuou, em setembro, 93,6 mil lojas que omitiram vendas nessa modalidade – fora dinheiro, cartões de débito e cheques -, e uma só loja recebeu R$ 5 milhões, mas declarou só R$12 mil. Além desse expediente, a fazenda paulista está dando 30% do valor do ICMS para quem pede cupom fiscal, pois raros são os estabelecimentos que o emitem espontaneamente. Se a CPMF fosse tão eficaz, isto seria desnecessário.

Os impostos, no Brasil, beiram os 35% do Produto Interno Bruto (PIB, que foi de 2,3 trilhões em 2006), e a sonegação é de cerca de 30% do PIB (Etco, André Franco Montoro Filho) . Isso dá muito mais do que a CPMF, e está muito acima das autuações da RFB em 2006, de R$ 55 bilhões. Recuperar esse dinheiro não só permitiria ao País prover serviços públicos decentes como expulsaria do mercado a má concorrência. Mas obter as informações que permitem detectar estes e outros crimes financeiros é algo que não depende de um tributo.

Mais dinheiro ainda e excelentes hospitais públicos teria o Pais se diminuísse a mania de grandeza das autoridades. A nova sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) irá custar R$ 328,5 milhões...

Luiz Leitão
luizmleitao@gmail.com
http://detudoblogue.blogspot.com




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