quinta-feira, 13 de novembro de 2008

“Necessitamos de um grande movimento para popularizar a ciência”

Boletim informativo da UFMG

Entrevista / Ildeu de Castro Moreira
Sílvia Dalben
Brasil conta com rede deficiente de centros e museus de ciência. Concentrados geograficamente no Sul e Sudeste, e em número reduzido, tais espaços, ainda assim, são considerados estratégicos para promover a cidadania, por meio da educação científica da população. O diagnóstico é do físico e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ildeu de Castro Moreira, diretor do Departamento de Popularização e Difusão de Ciência e Tecnologia do Ministério de Ciência e Tecnologia. Um dos participantes do IV Encontro do Fórum de Museus Universitário, que aconteceu na UFMG de 24 a 28 de julho, Ildeu conversou com o BOLETIM sobre a necessidade em desenvolver políticas de popularização da ciência.
Por que investir em popularização da ciência?Um dos grandes problemas do país é a educação. Nosso sistema educacional está muito aquém do que os brasileiros precisam e merecem. Um número muito pequeno de jovens termina o ensino médio e entra para a universidade. É preciso reformar o sistema de ensino – e rapidamente –, mas a popularização da ciência seria uma das alternativas para melhorar a educação. Nos últimos três anos, passamos a desenvolver política pública, com algumas iniciativas nesta linha.
Quais são elas?Temos, por exemplo, um programa de apoio à criação de centros e museus de ciência, que são poucos no Brasil, se comparados a outros países, e mal distribuídos – em geral estão no Sul e no Sudeste. Há grande carência de centros mais dinâmicos, inovadores, que possam oferecer às escolas, aos jovens, à população em geral, conhecimentos científicos interessantes. Outra iniciativa é aumentar a presença de Ciência e Tecnologia (C&T) na mídia brasileira. Os grandes jornais diários do país ainda identificam a ciência como um gueto, e muitas vezes apenas traduzem matérias produzidas no exterior. Precisamos formar mais jovens, formar jornalistas científicos, e os cientistas deveriam escrever mais. Tudo para criar um grande movimento, envolvendo a mídia, os pesquisadores e os centros e museus de ciência. Outra iniciativa importante é a Semana Nacional de C&T, que criamos em 2004 e este ano chega à terceira edição.
Quais os impactos dessas ações?Um conhecimento mais amplo sobre C&T ajuda, em primeiro lugar, a melhorar o ensino. A grande massa de freqüentadores dos museus de ciência no Brasil é formada por estudantes e professores. Isso ajuda a renovar a escola, melhorando a educação e aumentando a inclusão social. Essas iniciativas também demonstram que C&T não é algo abstrato, desligado do cotidiano. Conhecer a ciência, o modo como é produzida, suas controvérsias e limitações é importante para o cidadão, pois há questões relevantes que devemos decidir numa sociedade democrática, como o uso da energia nuclear, de transgênicos e das células tronco, questões que todo cidadão tem o direito de conhecer, para opinar. Cada vez mais, é necessário qualificar, cientificamente, a população, para que o país tenha um desenvolvimento econômico avançado, que lhe permita acompanhar as transformações do mundo, e que também se volte para questões sociais.
Quais os desafios para o avanço da popularização da ciência?Um dos aspectos é a necessidade de as universidades se abrirem mais para a sociedade. Durante muitas décadas, inclusive por razões históricas, ela esteve muito voltada para a elite. Nos últimos anos, tem-se intensificado o movimento de abertura para a comunidade, com expansão das atividades de extensão. Outro problema real é que a divulgação do universo complexo da C&T, no curto período de uma aula ou exposição, exige trabalho especializado e competente. É surpreendente que as pessoas consigam aprender tanto em tão pouco tempo. No entanto, serão capazes de aprender mais se o conteúdo for apresentado de maneira interessante. Um dos grandes problemas da escola brasileira é que ela gera desgosto para as pessoas diante da ciência, com a imposição de uma massa de informação, sem considerar a capacidade do estudante de descobrir o mundo.
Como os museus de ciência podem auxiliar as escolas?Não podemos vê-los como substitutos da escola. Eles são estruturas complementares. Não podemos abrir mão de escolas com laboratórios e professores qualificados. O ensino deve valorizar a experimentação, o interesse, a criatividade. Para tanto, as escolas necessitam contar com aparatos, oficinas de experimentos, professores qualificados, bibliotecas. Nenhum país do mundo conseguiu avançar sem uma escola de qualidade. Os museus e centros de ciência são espaços privilegiados e interdisciplinares, que podem mostrar para a escola como o ensino pode ser mais interessante e renovado. Contudo, um dos dilemas do país, nessa área, é possuir poucos espaços de ciência e um sistema escolar gigantesco que, como oferece poucas coisas interessantes, se dirige aos museus na tentativa de solucionar tais deficiências. É preciso atuar nas duas direções: ampliar e aperfeiçoar os museus de ciência, além de melhorar a escola.

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