25/02/2008
Por: Cássio Garcez*Após participar de uma das reuniões de relacionamento do Comperj – Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, realizada no último dia 31 de janeiro no Teatro Popular de Niterói, confesso que tive minhas preocupações com o futuro socioambiental de nossa região bastante agravadas com o que vi e ouvi. Segundo dados da própria Petrobras, o Comperj será construído numa área de 45 milhões de metros quadrados em Itaboraí, com investimentos previstos em torno de US$ 8,38 bilhões. Produzirá resinas termoplásticas e combustíveis, o que estimulará a instalação de indústrias que têm nos produtos petroquímicos suas matérias-primas básicas. Segundo estimativas da empresa, o complexo irá gerar cerca de 212 mil empregos diretos e indiretos, sendo seu principal objetivo o incremento da produção nacional de produtos petroquímicos. As obras para sua instalação estão previstas para começar ainda no primeiro semestre deste ano e o início da operação para 2012.Como era de se esperar, tal empreendimento trará impactos negativos consideráveis, diretos e indiretos, maiores ou menores, alguns deles imprevisíveis e outros assumidos como inevitáveis pelos técnicos, sobre a qualidade de vida da população e sobre o meio ambiente dos municípios da zona de influência (vide mapa abaixo). Isso apesar de alguns inúmeros benefícios que também estarão sendo criados, como as centenas de milhares de empregos, os pesados investimentos em mitigação, compensação e recuperação ambiental, e a implementação de diversos programas socioambientais. A questão é: será que tais benefícios justificarão os custos? Mapa dos municípios direta e indiretamente influenciados pelo do Comperj.Fonte: página eletrônica do Comperj (disponível em: http://www2.petrobras.com.br/portal/frame.asp?pagina=/Petrobras/portugues/comperj.asp&area=apetrobras&lang=pt. Acesso em: 11/2/08)Exaltado por todos os que possuem algum interesse na consolidação do Comperj (técnicos, políticos, empresários, trabalhadores, etc.), o lado bom dessa história parece ser bastante conhecido e quase fanaticamente cultuado por alguns. Mas, e os custos? Não os de implantação e operacionalização, mas os ambientais e sociais - também chamados externalidades? Muito pouco se fala deles.Por exemplo, para onde irão os milhares de desempregados atraídos pela oferta de trabalho, mas não aproveitados pelo Complexo e indústrias a ele ligadas? Haverá outras oportunidades e iniciativas públicas suficientes para contemplar esses trabalhadores e assim minimizar o provável aumento do risco social e da violência? Onde eles irão morar: em áreas legalizadas e devidamente urbanizadas ou em bolsões de miséria como é mister nesses casos? As prefeituras da zona de influência terão como ordenar a ocupação mais intensiva das áreas de expansão urbana sem prejudicar espaços de natureza melhor preservada e a qualidade de vida das populações, e ainda não privilegiar especuladores imobiliários? E a mobilidade de locais próximos ao complexo e com melhor infraestrutura, como Niterói, que já possui um sistema viário sofrível? Comportará o acréscimo de algumas dezenas de milhares de pessoas transitando de um lado a outro, ou entrará em colapso? Será que simples obras de engenharia de tráfego, nas quais nós moradores desta cidade estamos escaldados (devido à incompetência de alguns de seus mentores), conseguirão resolver o problema?Aliás, parece ser incontestável que o Comperj promoverá um significativo aumento no número de automóveis, ônibus e caminhões em tráfego nas ruas e estradas dos seus arredores, acarretando maiores índices de emissão de gases, material particulado e substâncias tóxicas no ar. Não é necessário ser especialista no assunto para saber que tal fato, aliado às chaminés industriais, vai fazer a poluição atmosférica aumentar e muito. Assim, florestas e nascentes da respectiva bacia hidrográfica não poderão ser contaminadas, inclusive por chuva ácida, ocasionando desequilíbrios vários e repercutindo na alteração de serviços ambientais (contenção de encostas, alimentação de lençol freático, etc.)? Existirão ações técnicas e governamentais suficientes e efetivas para atenuar estes impactos? Com relação à poluição atmosférica ocasionada diretamente pelas chaminés e produtos voláteis do Comperj, nós niteroienses, estando situados a nordeste do empreendimento, quadrante de onde sopra um dos mais fortes ventos do Estado, não seremos diretamente atingidos por essa poluição? E, no quadrante oposto - o sudoeste - de onde vem um vento ainda mais forte, as emissões não poderão agravar a contaminação citada anteriormente nas cabeceiras dos rios de Cachoeiras de Macacu, de onde vem a água por nós consumida? A utilização de poços artesianos, anunciada pelos técnicos da Petrobras como a alternativa mais viável e menos impactante ao fornecimento d’água do Complexo, não rebaixará o lençol freático prejudicando assim o equilíbrio hídrico da região e, novamente, o abastecimento humano (como usuários da Lagoa de São José de Itaboraí)? Por fim, mas sem esgotar o rol de minhas preocupações e angústias, alguns órgãos ambientais que já não funcionam bem, terão condições de serem saneados e fortalecidos (caso isso seja do real interesse dos governantes) a tempo de atender a provável maior demanda por posicionamentos e ações públicas em relação às questões ambientais?Sendo fato consumado a instalação do Comperj e o aumento dos impactos socioambientais em sua zona de influência, resta a nós, moradores e cidadãos conscientes, o aprendizado e o enfrentamento dessa nova realidade regional. Para isso, creio eu, precisamos nos engajar mais e mobilizar mais pessoas e grupos a participarem dos fóruns de discussão, a cobrar da Petrobras e das diversas esferas de governo mais e melhores ações de proteção, manutenção e recuperação do meio ambiente, contemplando também a luta pela garantia de direitos das comunidades atingidas - com o objetivo de tentar minimizar os impactos o quanto for possível, além de fazer valer mais a vontade do cidadão frente a decisões verticais (impostas pelo estado e empresas à população). É nosso direito antes de nosso dever.Mesmo que nesta atitude mais pró-ativa sejamos taxados de quixotes, precisamos ter claro que o atual e equivocado modelo de desenvolvimento – do qual o Comperj é um dos inúmeros exemplos de sua continuidade e força - não tem mais como atender aos anseios e necessidades da humanidade do terceiro milênio, devendo ser por isso repudiado e urgentemente substituído por outro mais justo e ecológico. Não podemos mais aceitar um conceito de progresso que confunda crescimento (quantidade) com desenvolvimento (qualidade). Que defenda o crescimento ilimitado – da população, da produção, do consumo, dos rejeitos, etc. - em um planeta de dimensões e recursos limitados. Que coloque como meta econômica um patamar onde hoje se encontra um dos povos mais poluidores, perdulários, belicosos e individualistas que existem, e para o qual seriam precisos outros três ou quatro planetas na satisfação do restante da humanidade em equivalência de condições. Que privilegie o funcionamento da economia, de decisões políticas unilaterais e de grandes corporações em detrimento da satisfação das reais e universais necessidades humanas. Que hoje dê emprego e trabalho – quando dá e de forma algumas vezes das mais espúrias (por exemplo, para a fabricação de armas, cigarros, bebidas, produtos poluidores; na especulação financeira e imobiliária; na exploração abusiva de trabalhadores; etc.) – e amanhã (mais) destruição. Que adie cada vez mais o atendimento – através de posicionamentos mais coerentes e ações mais efetivas - das legítimas preocupações da humanidade com o aquecimento global, com o desmatamento e outras questões de sobrevivência, qualidade de vida e qualidade socioambiental. Além dessas contradições, outros alertas vêm sendo divulgados há algum tempo pela comunidade científica e pelos meios de comunicação, reforçando o argumento a favor de alternativas urgentes. Por exemplo, já ultrapassamos a capacidade de auto-regulação do planeta, as mudanças climáticas são uma realidade, provocamos índices de perda de biodiversidade igualados a grandes cataclismos naturais e o número de refugiados ambientais aumenta a cada dia ao redor do mundo, além de outras alarmantes notícias. Até quando toleraremos esse modelo de desenvolvimento ultrapassado, produtor de uma infinidade de efeitos perversos e inaceitáveis? Até quando continuaremos adiando a necessária mudança ao aceitarmos passivamente o estabelecimento de mega-iniciativas que francamente a renegam, como é o caso do Comperj?* Psicólogo, guia especializado em atrativo natural, planejador ambiental (PGPA-UFF), mestre em Ciência Ambiental (PGCA-UFF), coordenador do Ecoando.
P. S. Recebi este artigo por email. Achei-o tao bom que sem a permissao do autor, copiei-o para o blog. Faço- o consciente ! Sei que estou sujeito a sofrer consequencias. Caso isto aconteça, foi por uma otima causa.
Antonio gomes Lacerda
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