Agora o alvo é Lulinha
DAVID FRIEDLANDER E RICARDO GRINBAUM
Poucas coisas deixam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tão fora do eixo quanto os ataques da oposição a sua família. Até aqui, de todas as denúncias da crise do mensalão, a que mais mexeu com o presidente foi a que misturou em setembro passado seu filho mais velho, Fábio Luís da Silva, o Lulinha, com a Telemar, maior operadora de telefones do país. A Telemar, soube-se então, investiu um dinheiro aparentemente extravagante - R$ 5 milhões - numa produtora de programas de TV sobre games da qual Lulinha é um dos sócios, a Gamecorp. Na semana passada, parlamentares da oposição reuniam informações para montar um segundo capítulo dessa história. Querem mostrar que o suposto favorecimento à Gamecorp teria ido além daquilo. Neste ano, a Telemar vai gastar mais R$ 4,9 milhões em patrocínio à Gamecorp. A oposição tenta mostrar que essa verba é exagerada e carimbá-la como uma espécie de "mensalinho" para o filho do presidente.
O episódio traz algumas certezas e muitas perguntas. A maior certeza: dadas as pesquisas recentes, Lula vai ser alvo de uma enxurrada de dossiês. Tende a ser um vale-tudo de denúncias em que se torcerá, como neste caso, até para que o pai pague eleitoralmente por eventuais pecados do filho. A campanha caminha para a troca não de idéias, mas de acusações e denúncias. As muitas perguntas que o episódio Lulinha-Telemar provoca dizem respeito a esse casamento em si. Desde o começo, tudo foi meio nebuloso na Gamecorp.
Os sócios da empresa tinham duas maneiras de falar sobre a participação de Lulinha na Gamecorp. Para a maioria das pessoas, diziam que ele era apenas conselheiro da empresa, embora fosse sócio desde o início. Quando interessava, davam a versão correta. Pessoas que acompanharam a montagem da empresa contaram a ÉPOCA que o nome de Lulinha foi usado para tentar abrir portas. Mesmo no berço, ela atraiu a Gradiente, primeiro anunciante do programa, e a Brasil Telecom, operadora de telefones que tentou ser sócia de Lulinha até perder a corrida para a concorrente Telemar. "Nunca escondemos a presença de Fábio nem usamos o nome dele. Isso sempre foi transparente", disse a ÉPOCA Leonardo Badra Eid, um dos sócios da Gamecorp. No ano passado, antes que a participação acionária de Lulinha se tornasse conhecida, outro sócio da Gamecorp negou a ÉPOCA que ele fosse um dos donos da empresa.
EM CENA Apresentadora do programa Game Zone, apresentado na Mix TV
A decisão de fechar agora o foco sobre Lulinha foi tomada pela cúpula do PFL. A avaliação é de que a crise do mensalão pegou o PT, mas não colou em Lula. Para atingir a popularidade do presidente, que vem melhorando nas pesquisas eleitorais, seria necessário um ataque frontal. Nos últimos dias, parlamentares do partido, como o deputado ACM Neto, buscaram junto a agências de publicidade e veículos de comunicação informações sobre os contratos da empresa do filho do presidente. O PSDB prefere não comprar abertamente essa briga. Líderes do partido, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o prefeito de São Paulo, José Serra, já sofreram esse tipo de ataque. Negócios feitos por seus filhos foram alvo de denúncias do PT.
A Telemar tornou-se sócia da Gamecorp no começo do ano passado. Pagou R$ 5 milhões por 35% das ações de uma empresa nanica, que acabara de ser criada por quatro sócios: Lulinha, dois amigos de infância, os irmãos Kalil e Fernando Bittar, e Leonardo Badra Eid. A Telemar, uma concessionária de serviço público, estava interessada no negócio por razões simplesmente comerciais? Ou imaginava tirar, de alguma forma, proveito da sociedade? A cifra extravagante estimulou esse tipo de especulação. Até onde se sabe, a Telemar não recebeu nenhuma vantagem extraordinária do governo, nada que não tenha sido oferecido a outras companhias telefônicas. A oposição continua procurando. Quer provar que o novo investimento de R$ 4,9 milhões não tem outro sentido a não ser abastecer a conta de Lulinha e seus amigos. "A gente vê um movimento político nessas denúncias. Nosso programa tem ótima audiência e bate o principal concorrente. ä Será que o Fábio não pode trabalhar?", diz Leonardo. Pode. E deve. Mas isso não eliminará o caráter estranho da relação entre a Telemar e Lulinha.#Q#
PRODUÇÃO No estúdio da Gamecorp, são feitos programas sobre jogos para dois canais de televisão. Também são produzidos comerciais para a Oi, operadora de celulares da Telemar
O dinheiro está sendo aplicado na Gamecorp por meio da Oi, a empresa de telefonia celular da Telemar. A Oi planeja gastar R$ 4,989 milhões em patrocínios nos dois programas de TV da Gamecorp - o G4, na Bandeirantes, e o Game TV, no canal Mix. O valor soma a publicidade de patrocinador exclusivo, os custos de produção dos programas, os direitos exclusivos de baixar músicas e vídeos da Gamecorp nos celulares da Oi e o aluguel dos horários nas TVs. "A questão é: vale a pena? Para a Telemar, vale. É um programa voltado para jovens, o público preferencial da Oi", afirma o presidente da Telemar, Ronaldo Iabrudi. ÉPOCA procurou profissionais de mídia de grandes agências de publicidade para ver se os valores pagos pela Telemar estão de acordo com o mercado. Eles dizem que, com os dados disponíveis, é difícil tirar conclusões, porque o pacote mistura anúncio com conteúdo. Um deles achou que se trata de muito dinheiro para um programa de games. Para dar uma referência, diz que com R$ 10 milhões é possível comprar uma cota de patrocínio do Campeonato Brasileiro de Futebol na Record em São Paulo.
Lulinha e seus sócios sabiam que podiam colocar o governo em apuros quando se associaram à Telemar. Eles negam, mas pessoas que participaram da negociação contaram a ÉPOCA que se chegou a cogitar a idéia de esconder, em nome de um laranja, a participação de Lulinha na empresa. A idéia não progrediu e resolveram fazer tudo direito. O sobrenome Silva fez toda a diferença no sucesso da Gamecorp - embora Lulinha não tenha nada a ver com o mundo empresarial. Lulinha, de 31 anos, é o filho mais velho do segundo casamento do presidente Lula, com Marisa Letícia. Formado em Biologia, já trabalhou no zoológico de São Paulo e, até entrar na Gamecorp, ganhava a vida como professor de Inglês e de Informática. Boa-praça, Lulinha sempre foi fanático por games e fascinado pela internet. Como o pai, é corintiano roxo e gosta de bater uma bolinha nos fins de semana com os amigos. Eles contam que Lulinha é tímido com os estranhos, veste-se como um adolescente e entre os colegas brinca como um garoto. Durante algum tempo assinou, como Fábio Silva, uma coluna sobre videogames na Folha de S.Paulo. Seus parceiros dizem que é o que mais entende de jogos no grupo. "Ele é fera. Sabe do que a molecada dos games gosta", afirma o sócio Kalil Bittar.
Lulinha foi convidado a integrar a sociedade pelos amigos, que já tinham experiência na área de publicidade. Filhos do ex-prefeito de Campinas Jacó Bittar, um dos melhores amigos do presidente Lula, Kalil e Fernando tinham uma produtora de programas de TV. Kalil trabalhou nas primeiras campanhas de Lula à Presidência. Leonardo Eid, que já era dono de uma empresa na área de publicidade, foi o último a se juntar ao grupo.
Eles começaram bem. Foram aos Estados Unidos e conseguiram um acordo com a G4, uma das maiores empresas americanas dedicadas a games. Pelo acerto, a Gamecorp poderia pegar as fitas e passar programas da G4 no Brasil. Os programas eram veiculados às 7 horas da manhã de sábado na TV Bandeirantes, num esquema mambembe. O apresentador às vezes era também office-boy da empresa. Mesmo assim, a Gamecorp atraiu o interesse de grandes empresários. O dono da Gradiente, Eugênio Staub, primeiro grande empresário a apoiar Lula na campanha de 2002, foi também o primeiro anunciante da Gamecorp. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Gradiente disse que, quando o programa foi lançado, tinha interesse em voltar ao mercado de games, do qual foi líder por muitos anos, e foi por isso que resolveu anunciar. O retorno ao mundo dos games, no entanto, acabou não ocorrendo.#Q#
Kalil Bittar, sócio e amigo do filho do presidente
SEDE A Gamecorp cresceu e quer canal para veicular 24 horas de programação
O banqueiro Daniel Dantas, que vive às turras com o governo, tentou seduzir os sócios da Gamecorp. Primeiro entrou como anunciante dos programas, com cerca de R$ 100 mil por mês, depois colou um executivo da Brasil Telecom para bajular Lulinha e os sócios. Dantas bancou a hospedagem e despesas da turma em feiras de games na Coréia e no Japão e estava sempre por perto para não deixá-los pagar conta nenhuma. Para os sócios, foi uma novidade. Eles estavam acostumados a discutir negócios em mesas de boteco de segunda categoria, em encontros que às vezes terminavam em guerrinhas de guardanapo amassado. O lobista da Brasil Telecom disse várias vezes que a companhia gostaria de se associar à Gamecorp. O plano começou a desmoronar quando entrou em cena o consultor Antoninho Marmo Trevisan, amigo do presidente Lula.
O pessoal da Gamecorp procurou Trevisan em busca de ajuda para colocar a contabilidade da empresa em ordem, exigência dos americanos da G4 para continuar a parceria no Brasil. A empresa de consultoria de Trevisan, uma das maiores do Brasil, passou a tratar a pequena Gamecorp como um cliente preferencial. Fez um plano de negócios e abriu uma concorrência para conseguir um sócio de peso para a produtora. A Trevisan preparou e enviou cartas-convite a dez potenciais interessados, como a Telefônica, a divisão de Novos Negócios do grupo Votorantim e o gigantesco fundo de investimento em empresas Advent, dos Estados Unidos. Só a Brasil Telecom e a Telemar seguiram em frente. A Telemar e a Trevisan afirmam que a operadora só ficou sabendo da presença de Lulinha na Gamecorp a partir dessa etapa.
SÓCIA Telemar na mira da oposição
A Telemar venceu a disputa, mas a escolha provocou desentendimentos entre os quatro sócios originais. Kalil Bittar, que já tentara fechar o negócio sem concorrência com o grupo de Daniel Dantas, insistiu novamente na parceria com a Brasil Telecom no momento em que eram analisadas as tomadas de preços. Kalil Bittar queria que a Gamecorp usassse o nome de Lulinha na aproximação com empresas. Em conflito com os outros sócios, há cerca de um ano ele foi colocado meio de lado no dia-a-dia da Gamecorp. Continuam todos amigos e saindo juntos, mas, para Kalil, nada de falar em nome da empresa. Em público, todos negam. Procurado por meio de sua assessoria de imprensa, Daniel Dantas preferiu não se manifestar.
No campo dos negócios, a Gamecorpo está crescendo. Fatura R$ 7 milhões por ano - R$ 5 milhões vindos do patrocínio da Oi. A empresa tem um estúdio profissional de gravação, contratou um diretor-comercial com experiência no mercado (para negociar anúncios de maneira profissional) e se prepara para montar salas virtuais de jogos, em que vários jogadores interagem pela internet. O grande salto pode vir a qualquer momento. A Gamecorp negocia a compra de espaço na Mix TV para colocar 12 horas de programação própria no ar. "A médio prazo, o projeto é ter 24 horas diárias", afirma Leonardo Eid. "Nós somos bons, mas isso ninguém quer saber." Ele tem razão. O que todo mundo quer saber, pelo menos agora, é quanto esse episódio arranhará ou não o prestígio do pai ilustre de seu sócio.
DISPUTA Amigo de Lula, Trevisan coordenou o processo de busca de um sócio de peso para a Gamecorp
ASSÉDIO A Brasil Telecom, que era controlada pelo banqueiro Daniel Dantas, foi uma das primeiras patrocinadoras dos programas da Gamecorp e quis virar sócia da empresa#Q#
POR DENTRO DO JOGO
Entenda o que faz a Gamecorp, empresa do filho do presidente Lula
O que é: empresa que produz programas para TV sobre jogos eletrônicos
Tamanho: tem 71 funcionários, entre contratados e prestadores de serviço. O faturamento estimado para 2005 é de R$ 7 milhões
Sócios: Fábio Luís Lula da Silva (filho de Lula), Kalil e Fernando Bittar (filhos de Jacó Bittar) e Leonardo Badra Eid têm 65% da companhia. A Telemar, controladora da Oi, possui 35%
Que programas produz
Onde são veiculados
Duração, freqüência e horários
Quanto recebe de patrocínios da Oi por ano
DAVID FRIEDLANDER E RICARDO GRINBAUM
Poucas coisas deixam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tão fora do eixo quanto os ataques da oposição a sua família. Até aqui, de todas as denúncias da crise do mensalão, a que mais mexeu com o presidente foi a que misturou em setembro passado seu filho mais velho, Fábio Luís da Silva, o Lulinha, com a Telemar, maior operadora de telefones do país. A Telemar, soube-se então, investiu um dinheiro aparentemente extravagante - R$ 5 milhões - numa produtora de programas de TV sobre games da qual Lulinha é um dos sócios, a Gamecorp. Na semana passada, parlamentares da oposição reuniam informações para montar um segundo capítulo dessa história. Querem mostrar que o suposto favorecimento à Gamecorp teria ido além daquilo. Neste ano, a Telemar vai gastar mais R$ 4,9 milhões em patrocínio à Gamecorp. A oposição tenta mostrar que essa verba é exagerada e carimbá-la como uma espécie de "mensalinho" para o filho do presidente.
O episódio traz algumas certezas e muitas perguntas. A maior certeza: dadas as pesquisas recentes, Lula vai ser alvo de uma enxurrada de dossiês. Tende a ser um vale-tudo de denúncias em que se torcerá, como neste caso, até para que o pai pague eleitoralmente por eventuais pecados do filho. A campanha caminha para a troca não de idéias, mas de acusações e denúncias. As muitas perguntas que o episódio Lulinha-Telemar provoca dizem respeito a esse casamento em si. Desde o começo, tudo foi meio nebuloso na Gamecorp.
Os sócios da empresa tinham duas maneiras de falar sobre a participação de Lulinha na Gamecorp. Para a maioria das pessoas, diziam que ele era apenas conselheiro da empresa, embora fosse sócio desde o início. Quando interessava, davam a versão correta. Pessoas que acompanharam a montagem da empresa contaram a ÉPOCA que o nome de Lulinha foi usado para tentar abrir portas. Mesmo no berço, ela atraiu a Gradiente, primeiro anunciante do programa, e a Brasil Telecom, operadora de telefones que tentou ser sócia de Lulinha até perder a corrida para a concorrente Telemar. "Nunca escondemos a presença de Fábio nem usamos o nome dele. Isso sempre foi transparente", disse a ÉPOCA Leonardo Badra Eid, um dos sócios da Gamecorp. No ano passado, antes que a participação acionária de Lulinha se tornasse conhecida, outro sócio da Gamecorp negou a ÉPOCA que ele fosse um dos donos da empresa.
EM CENA Apresentadora do programa Game Zone, apresentado na Mix TV
A decisão de fechar agora o foco sobre Lulinha foi tomada pela cúpula do PFL. A avaliação é de que a crise do mensalão pegou o PT, mas não colou em Lula. Para atingir a popularidade do presidente, que vem melhorando nas pesquisas eleitorais, seria necessário um ataque frontal. Nos últimos dias, parlamentares do partido, como o deputado ACM Neto, buscaram junto a agências de publicidade e veículos de comunicação informações sobre os contratos da empresa do filho do presidente. O PSDB prefere não comprar abertamente essa briga. Líderes do partido, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o prefeito de São Paulo, José Serra, já sofreram esse tipo de ataque. Negócios feitos por seus filhos foram alvo de denúncias do PT.
A Telemar tornou-se sócia da Gamecorp no começo do ano passado. Pagou R$ 5 milhões por 35% das ações de uma empresa nanica, que acabara de ser criada por quatro sócios: Lulinha, dois amigos de infância, os irmãos Kalil e Fernando Bittar, e Leonardo Badra Eid. A Telemar, uma concessionária de serviço público, estava interessada no negócio por razões simplesmente comerciais? Ou imaginava tirar, de alguma forma, proveito da sociedade? A cifra extravagante estimulou esse tipo de especulação. Até onde se sabe, a Telemar não recebeu nenhuma vantagem extraordinária do governo, nada que não tenha sido oferecido a outras companhias telefônicas. A oposição continua procurando. Quer provar que o novo investimento de R$ 4,9 milhões não tem outro sentido a não ser abastecer a conta de Lulinha e seus amigos. "A gente vê um movimento político nessas denúncias. Nosso programa tem ótima audiência e bate o principal concorrente. ä Será que o Fábio não pode trabalhar?", diz Leonardo. Pode. E deve. Mas isso não eliminará o caráter estranho da relação entre a Telemar e Lulinha.#Q#
PRODUÇÃO No estúdio da Gamecorp, são feitos programas sobre jogos para dois canais de televisão. Também são produzidos comerciais para a Oi, operadora de celulares da Telemar
O dinheiro está sendo aplicado na Gamecorp por meio da Oi, a empresa de telefonia celular da Telemar. A Oi planeja gastar R$ 4,989 milhões em patrocínios nos dois programas de TV da Gamecorp - o G4, na Bandeirantes, e o Game TV, no canal Mix. O valor soma a publicidade de patrocinador exclusivo, os custos de produção dos programas, os direitos exclusivos de baixar músicas e vídeos da Gamecorp nos celulares da Oi e o aluguel dos horários nas TVs. "A questão é: vale a pena? Para a Telemar, vale. É um programa voltado para jovens, o público preferencial da Oi", afirma o presidente da Telemar, Ronaldo Iabrudi. ÉPOCA procurou profissionais de mídia de grandes agências de publicidade para ver se os valores pagos pela Telemar estão de acordo com o mercado. Eles dizem que, com os dados disponíveis, é difícil tirar conclusões, porque o pacote mistura anúncio com conteúdo. Um deles achou que se trata de muito dinheiro para um programa de games. Para dar uma referência, diz que com R$ 10 milhões é possível comprar uma cota de patrocínio do Campeonato Brasileiro de Futebol na Record em São Paulo.
Lulinha e seus sócios sabiam que podiam colocar o governo em apuros quando se associaram à Telemar. Eles negam, mas pessoas que participaram da negociação contaram a ÉPOCA que se chegou a cogitar a idéia de esconder, em nome de um laranja, a participação de Lulinha na empresa. A idéia não progrediu e resolveram fazer tudo direito. O sobrenome Silva fez toda a diferença no sucesso da Gamecorp - embora Lulinha não tenha nada a ver com o mundo empresarial. Lulinha, de 31 anos, é o filho mais velho do segundo casamento do presidente Lula, com Marisa Letícia. Formado em Biologia, já trabalhou no zoológico de São Paulo e, até entrar na Gamecorp, ganhava a vida como professor de Inglês e de Informática. Boa-praça, Lulinha sempre foi fanático por games e fascinado pela internet. Como o pai, é corintiano roxo e gosta de bater uma bolinha nos fins de semana com os amigos. Eles contam que Lulinha é tímido com os estranhos, veste-se como um adolescente e entre os colegas brinca como um garoto. Durante algum tempo assinou, como Fábio Silva, uma coluna sobre videogames na Folha de S.Paulo. Seus parceiros dizem que é o que mais entende de jogos no grupo. "Ele é fera. Sabe do que a molecada dos games gosta", afirma o sócio Kalil Bittar.
Lulinha foi convidado a integrar a sociedade pelos amigos, que já tinham experiência na área de publicidade. Filhos do ex-prefeito de Campinas Jacó Bittar, um dos melhores amigos do presidente Lula, Kalil e Fernando tinham uma produtora de programas de TV. Kalil trabalhou nas primeiras campanhas de Lula à Presidência. Leonardo Eid, que já era dono de uma empresa na área de publicidade, foi o último a se juntar ao grupo.
Eles começaram bem. Foram aos Estados Unidos e conseguiram um acordo com a G4, uma das maiores empresas americanas dedicadas a games. Pelo acerto, a Gamecorp poderia pegar as fitas e passar programas da G4 no Brasil. Os programas eram veiculados às 7 horas da manhã de sábado na TV Bandeirantes, num esquema mambembe. O apresentador às vezes era também office-boy da empresa. Mesmo assim, a Gamecorp atraiu o interesse de grandes empresários. O dono da Gradiente, Eugênio Staub, primeiro grande empresário a apoiar Lula na campanha de 2002, foi também o primeiro anunciante da Gamecorp. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Gradiente disse que, quando o programa foi lançado, tinha interesse em voltar ao mercado de games, do qual foi líder por muitos anos, e foi por isso que resolveu anunciar. O retorno ao mundo dos games, no entanto, acabou não ocorrendo.#Q#
Kalil Bittar, sócio e amigo do filho do presidente
SEDE A Gamecorp cresceu e quer canal para veicular 24 horas de programação
O banqueiro Daniel Dantas, que vive às turras com o governo, tentou seduzir os sócios da Gamecorp. Primeiro entrou como anunciante dos programas, com cerca de R$ 100 mil por mês, depois colou um executivo da Brasil Telecom para bajular Lulinha e os sócios. Dantas bancou a hospedagem e despesas da turma em feiras de games na Coréia e no Japão e estava sempre por perto para não deixá-los pagar conta nenhuma. Para os sócios, foi uma novidade. Eles estavam acostumados a discutir negócios em mesas de boteco de segunda categoria, em encontros que às vezes terminavam em guerrinhas de guardanapo amassado. O lobista da Brasil Telecom disse várias vezes que a companhia gostaria de se associar à Gamecorp. O plano começou a desmoronar quando entrou em cena o consultor Antoninho Marmo Trevisan, amigo do presidente Lula.
O pessoal da Gamecorp procurou Trevisan em busca de ajuda para colocar a contabilidade da empresa em ordem, exigência dos americanos da G4 para continuar a parceria no Brasil. A empresa de consultoria de Trevisan, uma das maiores do Brasil, passou a tratar a pequena Gamecorp como um cliente preferencial. Fez um plano de negócios e abriu uma concorrência para conseguir um sócio de peso para a produtora. A Trevisan preparou e enviou cartas-convite a dez potenciais interessados, como a Telefônica, a divisão de Novos Negócios do grupo Votorantim e o gigantesco fundo de investimento em empresas Advent, dos Estados Unidos. Só a Brasil Telecom e a Telemar seguiram em frente. A Telemar e a Trevisan afirmam que a operadora só ficou sabendo da presença de Lulinha na Gamecorp a partir dessa etapa.
SÓCIA Telemar na mira da oposição
A Telemar venceu a disputa, mas a escolha provocou desentendimentos entre os quatro sócios originais. Kalil Bittar, que já tentara fechar o negócio sem concorrência com o grupo de Daniel Dantas, insistiu novamente na parceria com a Brasil Telecom no momento em que eram analisadas as tomadas de preços. Kalil Bittar queria que a Gamecorp usassse o nome de Lulinha na aproximação com empresas. Em conflito com os outros sócios, há cerca de um ano ele foi colocado meio de lado no dia-a-dia da Gamecorp. Continuam todos amigos e saindo juntos, mas, para Kalil, nada de falar em nome da empresa. Em público, todos negam. Procurado por meio de sua assessoria de imprensa, Daniel Dantas preferiu não se manifestar.
No campo dos negócios, a Gamecorpo está crescendo. Fatura R$ 7 milhões por ano - R$ 5 milhões vindos do patrocínio da Oi. A empresa tem um estúdio profissional de gravação, contratou um diretor-comercial com experiência no mercado (para negociar anúncios de maneira profissional) e se prepara para montar salas virtuais de jogos, em que vários jogadores interagem pela internet. O grande salto pode vir a qualquer momento. A Gamecorp negocia a compra de espaço na Mix TV para colocar 12 horas de programação própria no ar. "A médio prazo, o projeto é ter 24 horas diárias", afirma Leonardo Eid. "Nós somos bons, mas isso ninguém quer saber." Ele tem razão. O que todo mundo quer saber, pelo menos agora, é quanto esse episódio arranhará ou não o prestígio do pai ilustre de seu sócio.
DISPUTA Amigo de Lula, Trevisan coordenou o processo de busca de um sócio de peso para a Gamecorp
ASSÉDIO A Brasil Telecom, que era controlada pelo banqueiro Daniel Dantas, foi uma das primeiras patrocinadoras dos programas da Gamecorp e quis virar sócia da empresa#Q#
POR DENTRO DO JOGO
Entenda o que faz a Gamecorp, empresa do filho do presidente Lula
O que é: empresa que produz programas para TV sobre jogos eletrônicos
Tamanho: tem 71 funcionários, entre contratados e prestadores de serviço. O faturamento estimado para 2005 é de R$ 7 milhões
Sócios: Fábio Luís Lula da Silva (filho de Lula), Kalil e Fernando Bittar (filhos de Jacó Bittar) e Leonardo Badra Eid têm 65% da companhia. A Telemar, controladora da Oi, possui 35%
Que programas produz
Onde são veiculados
Duração, freqüência e horários
Quanto recebe de patrocínios da Oi por ano
G4 Brasil - Bandeirantes -30 min, aos sábados, às 22h30
R$ 2,59 mi
G4 Drops -Bandeirantes -3 min, de 2a a 6a, entre 0h30 e 1h
Game Zone -Mix TV -30 min, diário, às 18h
R$ 2,39 mi
Play Hit -Mix TV -30 min, diário, às 18h30
Game Zone 2 -Mix TV
30 min, diário, às 19h30
TOTAL
R$ 4,98 mi
O contrato com a Gamecorp inclui: compra do horário nas TVs, patrocínio exclusivo, custo de produção do programa e direito exclusivo de baixar músicas e vídeos da Gamecorp nos celulares da Oi
A reportagem é da Revista Época. A conclusao é sua.
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